quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Fugas são a principal causa de sumiço de crianças e adolescentes, sendo que 57,3% voltam para casa ou são localizados, mostra estudo


As fugas são a principal causa do desaparecimento de crianças e adolescentes, segundo estudo do projeto Caminho de Volta, da Faculdade de Medicina da Universidade de uSão Paulo (USP). Entre 302 casos analisados, com base nos boletins de ocorrência e em entrevistas com familiares, 73,2% são fugas. Do total de desaparecidos, 173 (57,3%) voltaram para casa ou foram localizados. Sete estavam mortos. Em entrevista aos psicólogos do projeto, 84 meninos e meninas contaram por que fugiram: 33% disseram que a fuga foi motivada por conflitos familiares e 25% queriam viver uma aventura. Em menor escala, 10,7% declararam terem sido vítimas de violência em casa e 4,8% de abuso sexual.“A partir do levantamento e das entrevistas, foi possível perceber que os meninos começam a fugir muito cedo, a partir de 8 anos. Já na adolescência, são as meninas que mais fogem: duas vezes mais do que garotos, com idades entre 14 e 17 anos”, diz a psicanalista Claudia Figaro Garcia, coordenadora de psicologia do Caminho de Volta.Pelo menos 32,1% dos entrevistados tinham algum tipo de distúrbio de conduta, a maioria relacionada ao uso abusivo de álcool e drogas. “Existem muitos fatores que podem motivar a fuga, mas a relação com o uso de drogas é hoje muito presente. Acaba sendo um estimulante para sair de casa. A internet, com acesso a todo tipo de informação, para o bem ou para o mal, também exerce grande influência sobre o adolescente. Por isso, o diálogo entre pais e filhos é cada vez mais importante”, diz a psicóloga Lourdes Gigliotti, voluntária da organização não-governamental Mães da Sé (www.maesdase.org.br).
“O segredo é buscar o entendimento. Criticar e brigar só vai fazer com que queiram sair de casa novamente”, completa a psicóloga. A maioria das meninas (71,8%) e dos meninos (64,4%) entrevistados é reincidente - há quem tenha fugido 23 vezes. Durante a fuga, 56,5% dos meninos ficaram na rua e 17,9% foram acolhidos por desconhecidos, enquanto a maioria das meninas recebeu abrigo de familiares (55,6%) e apenas 15,6% delas ficaram na rua. Os meninos sobreviveram como pedintes (17,9%) ou furtando (7,7%). Entre as meninas, a proporção é de 8,9% e 2,2%.
“O desejo de obter imediatamente o que se quer e a dificuldade de se submeter às frustrações ou adiar seus planos podem levar a criança ou o adolescente a optar pela fuga de casa, arriscando-se”, diz o estudo. Embora reconheçam a dificuldade de apontar com segurança as razões da fuga, os pesquisadores atestam que “pais proibitivos, muito exigentes ou fragilizados não possuem modelos internalizados que lhes garantam segurança para dizer ‘não’, além de temerem perder o amor dos filhos”.
Isso não significa deixar de impor limites aos filhos, como alerta o psicólogo Marco Antonio de Tommaso. “O adolescente é contestador e acredita no mito da invulnerabilidade, ou seja, acha que nada irá acontecer com ele. Os limites, desde que negociados, representam segurança. Eles têm de aprender o que podem e o que não podem fazer e os motivos”, diz o especialista. Ele sugere aos pais corrigir o comportamento dos filhos, e não a personalidade. “Não chame o adolescente de preguiçoso. Apenas exija que faça a lição de casa. Nessa idade, eles são muito sensíveis a críticas e têm uma auto-estima oscilante.”
Os casos analisados foram registrados na capital pela Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e em oito postos da Polícia Judiciária do Interior (Deinter), entre setembro de 2004 e maio de 2006. No período, desapareceram 177 meninas e 125 meninos. Além de tentar apontar as causas dos desaparecimentos, o Caminho de Volta mantém um banco de DNA, para permitir a identificação dos que são encontrados mortos ou anos depois. Desde abril, o projeto atende famílias de crianças e adolescentes desaparecidos ( 3311-3550 e 3061-7589 e www.caminhodevolta.fm.usp.br).
FONTE: O ESTADÃO
POSTADO POR: MARINA CELESTINO

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